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Episódio 6: Codinome Vampiro

  • Foto do escritor: luzesombra
    luzesombra
  • 12 de set. de 2024
  • 17 min de leitura

Logo após dizer que bebia o sangue de suas vítimas, Marcelo Costa de Andrade foi chamado de "Vampiro de Niterói". Nesse episódio, além de analisarmos essa parte de sua história, tentaremos explicar um pouco melhor sobre as condições mentais do assassino serial.

 

AVISO: A história a seguir contém cenas fortes de violência infantil, portanto não é recomendado para pessoas sensíveis ao tema e menores de 18 anos. Todas as informações contidas foram retiradas de fontes públicas. Quaisquer solicitações, favor, enviar um e-mail para luzesombrapodcast@gmail.com.




 

“Vampiro de Niterói: Serial Killer de Niterói é ameaça à sociedade”
Vampiro de Niterói estuprou, matou e bebeu sangue de crianças, em Niterói e Itaboraí. Ele está a mais de 30 anos no hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo, que será fechado por decisão do CNJ. Médicos e Promotores relatam que a doença mental dele não tem cura. Mas seu destino deverá ser o Hospital de Jurujuba, na região sul de Niterói.”

 

Essa é uma parte da reportagem feita no dia 26 de fevereiro desse ano de 2024 na página online chamada “Folha Leste”. A reportagem completa fala sobre a decisão do Conselho Nacional de Justiça de fechar todos os hospitais de custódia do país, que afetou também o Hospital Pena Psiquiátrico Roberto Medeiro, que faz parte do Complexo de Gericinó, na zona oeste da cidade.

 

Vamos, então, relembrar um pouco de toda história: Marcelo foi preso em 17 de dezembro de 1991 enquanto trabalhava como entregador de panfletos de uma joalheria em Copacabana, na ocasião, ele estava no escritório da empresa. O delegado chegou a Marcelo bem depois. Ele estava investigando o desaparecimento do pequeno Ivan Medeiros de Abreu, que tinha seis anos de idade, quando seu irmão mais novo tomou coragem e deu um depoimento ao delegado contando tudo que aconteceu com ele e seu irmão.

 

A partir daí, as investigações tiveram uma dimensão que imagino que o delegado não podia imaginar. As informações da época ainda explicam que, assim que os policiais chegaram no trabalho de Marcelo, ele disse que as autoridades demoraram muito para descobrir sobre ele, e sentiu-se calmo, pois já sabia que aquele dia iria chegar. Ele foi então levado para a 76 DP de Niterói e ficou aos cuidados do departamento de homicídios e foi lá que as coisas se tornaram ainda piores.

 

O Jornal o “Fluminense” de 19 de janeiro do ano seguinte, 1992, diz que, Marcelo na época confessou o assassinato de mais sete crianças além de Ivan. Essa matéria explica como se deu a captura de Marcelo e ainda diz mais um pouco sobre seus desdobramentos. Há um parágrafo que diz assim:

 

“O policial, no entanto, desconfiou que Ivan Medeiros não foi a primeira vítima do psicopata. Após quase um mês de investigação, ele descobriu mais cinco meninos de rua assassinados, cuja autoria dos crimes o tarado já confessou. Codong relatou que o criminoso não consegue relacionar-se sexualmente com mulheres, e quando sua libido manifestava-se, ele procurava meninos de rua para satisfazer-se.”

 

Codong mencionado acima era o chefe o setor de homicídios da delegacia na época.

 

Em um mês de investigações, portanto, Marcelo já havia confessado o assassinado de sete crianças que eles diziam ser de rua, mas logo depois nós descobrimos que essas crianças, infelizmente, viviam no extremo da sociedade. Fico imaginando o quão impactante deve ria ser para os investigadores cada passo que davam nesse caso, pois em muito pouco espaço de tempo eles descobriam muito mais informações, e Marcelo não me pareceu alguém que escondeu muito as atrocidades cometidas.

 

No dia 15 de fevereiro, menos de um mês depois das primeiras confissões, os investigadores descobriram que ele havia assassinato 15 crianças em um período de apenas um ano. Outra matéria d’O Fluminense desse dia explica como se deu os outros passos dessa investigação. (Veja a matéria completa AQUI)

 

Entre 1992 e 1993, Marcelo Costa de Andrade foi acusado e preso pelo assassinato de 14 crianças. Muitos casos foram confirmados depois das investigações feitas pelos policias, mas muitos outros ficaram sem solução, como o caso do menino que Marcelo diz ter matado em uma de suas viagens a Minas Gerais. Os policiais até juntaram uma força-tarefa para investigar o caso, mas não encontraram mais pistas.

 

Marcelo passou por diversos exames psicológicos e, por ter sido diagnosticado com doença mental incurável, não foi sequer julgado. Ele ficou sob custódia no Hospital Roberto Medeiros, em Niterói e depois ficou preso em um manicômio judiciário. Por um bom tempo, até que, em janeiro de 1997, Marcelo fugiu desse lugar, mas não ficou foragido por muito tempo.

 

Depois de uma denúncia anônima, os policiais conseguiram encontrar Marcelo em uma cidade no Ceará, onde ele foi direto depois da fuga, para reencontrar com a família do pai. Depois disso, ele foi levado para o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo, também em Niterói, onde se encontra até os dias de hoje.

 

E é nesse ponto da história que voltamos ao primeiro episódio de nosso podcast: Sobre o Impasse que existia entre sua prisão, o fechamento de manicômios judiciários e os moradores do bairro de Jurujuba, que não queriam que sua transferência fosse feita para o hospital psiquiátrico de lá, principalmente, depois que um dos internos conseguiu fugir e assassinou um porteiro do entorno, isso não tem muito tempo.

 

Como sabemos houve uma resolução do Conselho Nacional de Justiça em 2023, promulgada pela ex-Ministra Rosa Weber, que fala sobre o fechamento de manicômios judiciários em todo país, baseando-se na lei que se antecede e que humaniza um pouco mais sobre os direitos de pessoas com algum tipo de neurodivergência. Com tal resolução, o Henrique Roxo deveria ser fechado completamente, e os internos que habitavam ali, remanejados para outros hospitais.

 

Só que Marcelo sempre foi um caso a parte: as notícias afirmam categoricamente que ele não possui condições mentais boas o suficiente para se tratado, o que o impossibilitava de ter sua liberdade concedida. Seu advogado até tentou esse feito alguns anos atrás, mas ela foi negada, pois os exames psicológicos anuais de Marcelo ainda atestam sua deficiência mental.

 

Com o fechamento do Henrique Roxo, ele seria, portanto, transferido para o hospital Pisiquiátrico de Jurujuba, mas a juíza do caso negou sua transferência, tanto por força dos moradores, quanto por perceber que o próprio hospital estava preparado para receber um sujeito como Marcelo. Por isso, a juíza no início desse ano de 2024 decretou que ele continuaria no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo. E é lá que ele se encontra até esse momento, pelo que pude entender, sozinho.


 

Com um pequeno resumo de nossa história, podemos perceber que ainda existem dois assuntos relevantes que ainda não falamos em nosso podcast, e são eles:

 

1 – O porquê de ele ficar conhecido como “vampiro”, pois Marcelo muitas vezes informou que bebeu o sangue de suas vítimas;

2 – O resultado de seus exames de condições mentais que o tornaram imputável, portanto, ele não foi julgado, mas apenas internado.

 

E é sobre esses dois assuntos que vamos falar no episódio de hoje. Eu sou Thiago Pined e você está ouvindo a “Luz e Sombra: O Caso do Vampiro de Niterói”.


 

Quando preso, no final do ano de 1991, Marcelo foi conhecido pelos noticiários locais como “Tarado da BR-101”, pois era nessa estrada que ligava a cidade de Niterói com Manilha, em Itaboraí — onde o próprio morava — que ele cometia seus crimes, assassinando e abusando das crianças que ludibriava.

 

Quando foi preso, Marcelo não me pareceu muito difícil em apresentar informações, tanto sobre o crime no qual foi presa, quanto em falar sobre seus outros assassinatos. É só ver a cronologia: em dezembro de 1991, Marcelo foi preso, em janeiro do ano seguinte, ele afirmou ser o culpado pelo assassinato pela morte de mais oito crianças, e no mês seguinte, ele confirmou ter assassinado quatorze crianças em diversas localidades. Além disso, Marcelo afirmou em depoimento ter bebido o sangue de algumas das crianças, como mostra a matéria da Revista IstoÉ Senhor daquele ano. Existe um destaque em amarelo e vermelho no pé de página onde não é possível entender se aquilo é uma entrevista com o autor dos crimes, ou um emaranhado de frases que ele disse de forma geral, mas há um paragrafo com um quadrado em vermelho de estaque e itálico de parafraseia o que ele diz sobre isso, que é o seguinte:

 

“Eu tomei sangue dele, porque ele era muito bonito. Se eu tomasse o sangue também ficava bonito”. (Depoimento sobre o assassinato de Anderson Gomes Gourlart, 11 anos, estrangulado e morto a pauladas, em 6 de agosto de 1991, num CIEP inacabado do bairro do Porto Velho, em São Gonçalo, município vizinho de Niterói)”

 

E é com essa nova informação que o próprio Marcelo diz é que ele começa a ser chamado de vampiro. Ele afirmou categoricamente que bebeu sangue de diversos meninos. Em entrevista feita para Klaylian Marcela Santos Lima Monteiro para seu trabalho de doutorado em psicologia Clínica da PUC São Paulo, existe uma passagem que ele também faz tal afirmação. Vou ler apenas essa parte no anexo do documento com a entrevista da autora com Marcela, e quero fazer uma observação de que quando eu me referir a “E”, estou falando da entrevistadora, e “M” será Marcelo. O trabalho completo você encontra AQUI.

 

 

Logo assim que o primeiro episódio do podcast foi lançado, no dia 4 de julho, o jornalista de true crime Ulisses Campbell fez uma série de reportagens para o jornal “O Globo” sobre Marcelo. Essas matérias se davam ao fato de que o assassino havia escrito algumas cartas para uma antiga estudante de psicologia chamada Solange Diniz de Carvalho, estagiou no Henrique Roxo.

 

A matéria de título “Totalmente Irrecuperável” e “Sedutor Barato”: Psiquiatras analisam cartas de amor do vampiro de Niterói para psicóloga” é muito interessante de abrange ainda mais o assunto desse episódio. Nela, é possível claramente observar um pouco melhor e tentar entender mais um pouco de sua mente, que, para mim, é tema de muita curiosidade.

 

As cartas feitas à mão foram escritas e entregues à psicóloga Solange que estagiava no local em 2008. O jornalista tomou posse delas e as levou para análise de dois dos maiores psiquiatras do país especializados em mentes de assassinos, como diz a própria matéria. Mas vou destacar alguns parágrafos que acho importante de mostrar aqui para vocês. Que dizem o seguinte (a matéria completa está disponível AQUI):

 

“O trecho de uma das correspondências enviadas à então estudante de Psicologia Solange Diniz de Carvalho, em 2008, diz o seguinte: “Quando eu tinha 10 anos, fiquei me prostituindo na Cinelândia, Central do Brasil e na Galeria Alasca, em Copacabana, até os meus 18 anos de idade. E eu ganhava um bom dinheiro assim. Aconteceu que eu cresci e comecei a gostar de garoto novo para sexo. Aconteceu também de eu ficar endemoniado e doido da cabeça. Então eu matei 13 garotos de 5 a 13 anos de idade em lugares desertos. Eu bebia o sangue dos meninos e estuprei eles. Isso em um ano. É por isso que estou há muitos anos preso.”

 

O psiquiatra Guido Palomba leu as mensagens do Vampiro e teceu uma avaliação. “O conteúdo das cartas é típico de criminoso com gravíssimos distúrbios mentais. Esse tipo de indivíduo é totalmente irrecuperável. Nasceu deformado, é anormal e continuará sendo até morrer. A deformidade é estrutural e não existe tratamento que possa modificá-lo”, opinou o médico, autor do livro "Insania furens: Casos verídicos de loucura e crime".

A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa, autora do best-seller "Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado", também leu as cartas escritas pelo Vampiro de Niterói. Segundo sua análise, ele não demonstrou comportamento infantil — pelo contrário, mostrou-se um “sedutor barato e burro”, principalmente quando fala que se masturbou no hospital. Ana Beatriz também observou a astúcia dele em bolar um plano para a estudante de Psicologia tirar uma carteirinha para visitá-lo na cadeia. “Fica claro que ele apresenta um déficit cognitivo, o que antes era chamado de retardo mental. Dá para chegar a essa conclusão lendo o que ele escreveu e a forma como se expressa”, disse a médica.”

 

E essa matéria me dá um gancho para abordarmos o segundo tópico desse episódio: o das condições mentais de Marcelo Costa de Andrade.

 

 

Para entrarmos nesse tópico, vou destacar para vocês algumas palavras que retirei desses trechos da matéria d’O Globo. Que são elas: criminoso, distúrbios mentais, irrecuperável, deformado, anormal, sedutor barato, burro, déficit cognitivo, retardo mental.

 

São símbolos que carregam um peso bem forte quando se lê, e, quando fui pesquisando sobre o tema nesses meus meses de criação do podcast, me deparei com outros substantivos ainda mais fortes: como tarado, maníaco, estrangulador, monstro, e, claro, vampiro, além de muitos outros que eu poderia ficar horas falando, mas... no lugar de repetirmos o que as mídias falavam sobre ele, vamos tentar entender um pouco melhor de sua mente da forma mais técnica possível, mesmo que eu, infelizmente, não tenha em mãos os autos do processo e, por consequência, seus laudos psicológicos.

 

E, para isso, precisamos entender uma coisa: a Igreja Universal do Reino de Deus, assunto do episódio passado, não tem nada a ver com as atrocidades que ele cometeu. Eu meu ver, ela foi uma peça que o ajudou a procurar uma espécie de justificativa para os assassinatos das crianças, mas, enquanto eu analiso todos os fatos que consegui ter sobre esse caso nos dados que encontro, eu acho que Marcelo deve ter ligado a tal pregação que ele diz ter ouvido com a idade das crianças.

 

Sem ter os depoimentos de Marcelo quando foi preso há trinta e três anos, e tendo apenas transcrições de entrevistas feitas posteriormente com ele e reportagens, me atrevo a dizer que a pressão que ele sofreu para explicar o porquê de ter cometido os assassinatos fez com que ele ligasse a alguma pregação da igreja. E o que me intriga também é a parte em que ele cita ter bebido o sangue das crianças. Não achei em lugar nenhum qualquer comprovação de que isso tenha acontecido verdadeiramente, além da fala do assassino. E, por conta disso, tenho duas teorias:

 

1.      Ou ele, percebendo a fama que estava tendo por conta dos homicídios que cometeu, adicionou mais essa informação para deixar tudo ainda pior, pois claramente Marcelo não percebe a dimensão de tudo que ocorreu;

2.      Ou ele realmente bebeu o sangue de algumas das vítimas depois de assassiná-las, enquanto estava em delírio pelo ato cometido.

 

O que me incomoda um pouco em toda essa história do sangue é que, quando ele é perguntado sobre isso, a história me parece um tanto mecânica e superficial...


 

Bem, como não posso confirmar todas essas minhas dúvidas, vamos continuar.

 

Como eu disse em episódio anterior, no ano de 2019, após um pedido de liberdade feita pelo advogado do réu, a juíza responsável pelo caso negou o pedido, visto que o laudo psiquiátrico feito atesta ele com “doença mental incurável”. Sabemos que todo o caso se der no início dos anos 1990, e que, naquela época, doenças mentais eram tratadas cheias de tabus, o que explica essa classificação muito abrangente. Agora sabemos que esse assunto é muito mais abrangente.

 

Por exemplo, agora amplamente conhecido, quando tratamos algo relacionado a saúde, para diagnóstico de certo tipo de doença se usa a Classificação Internacional de Saúde, ou CID, que, como as normas técnicas da indústria, serve para unificar os conhecimentos das doenças. Ou seja, com essa classificação, uma pessoa pode ser diagnosticada com um número no Brasil e, se precisar de atendimento médico no Japão, o profissional lá saberá qual é esse diagnóstico.

 

De modo geral O CID é dividido em alguns grupos de letras principais que definem uma classificação geral de doenças que se assemelham. Mas cada um desses grupos é dividido em subgrupos registrados por números. Por exemplo: Os grupos A00 e B99 dizem sobre doenças infecciosas e parasitárias, os grupos C00 e D48 dizem sobre neoplasias, e assim em diante. O grupo de doenças mentais e comportamentais está incluso no F00 a F99.

 

É engraçado que só agora essa classificação é amplamente falada, e as pessoas têm conhecimento sobre ela. No entanto, nas minhas pesquisas, descobri que uma classificação de doenças tem sido feita desde o século XVI. E a partir dali houve diversas tentativas de unificar essa classificação para que fosse adotada por várias nações, mas apenas no ano de 1893 que a classificação foi aprovada e adotada. É engraçado e um tanto curioso entender que tal classificação foi adotava há mais de um século atrás. E vou contar outro fato curioso: a Organização Mundial da Saúde (OMS) adicionou uma sessão destinada a transtornos mentais em 1948, na sexta edição da CID. Para terem uma noção de tempo, faltam apenas 24 anos para que tal decisão complete 100 anos.

 

É engraçado e curioso que, mesmo sabendo agora que tal classificação de doenças, principalmente transtornos mentais, já é usada há um tempo, ainda existe muita, mas muita banalização dos transtornos mentais, que muitas vezes são vistos com diversos tabus e preconceitos.

 

 

É muito estranho para mim definir Marcelo sem ter em mãos os laudos psiquiátricos dele, mas vou me embasar nos artigos e trabalhos que encontrei sobre o tema e, principalmente na escritora especialista em serial killers do país, Ilana Casoy. Vamos a um passo de cada vez:

 

Quero apresentar, primeiros, algumas informações que encontrei em um trabalho acadêmico intitulado “Serial Killer: uma análise da eficácia dos meios de execução da pena no Brasil” (disponível AQUI), de Sara Guerra de Paula, que vai apresentar a eficácia na pena de um serial killer no país, mas o que quero destacar são algumas partes que dizem respeito ao Marcelo.

 

O trabalho é de 2021 e, na época, Marcelo era o único preso serial killer que já tinha concluído quase a pena total em regime fechado, que é de 30 anos, o que ela afirma ser um desafio jurídico constitucional potencial. Ela explica um pouco sobre esse problema com Marcelo no seguinte parágrafo:

 

“Em nossa jusrisprudência temos casos em que o homicida foi julgado como imputável e encaminhado a estabelecimento correcional comum, a exemplo do Maníaco do Parque. Mas, também, temos casos em que o Serial Killer foi julgado como inimputável, como o Vampiro de Niterói que cumpre medida de segurança. Marcelo é psicótico, mas segundo o psiquiatra que o acompanha, está quase sempre lúcido, principalmente quando isso o beneficia”.

 

 Aí já temos uma classificação de Marcelo: de que é psicótico. No mesmo trabalho a autora diz que ele ouve vozes, o que o faz se encaixar nesse quesito, mas a única fonte que li sobre isso foi da própria Casoy, que diz em seu livro que Marcelo, quando criança, via e ouvia coisas, sem dar muitos detalhes sobre esse assunto. Mas o próprio Marcelo nunca disse que ele ouvia alguém o mandando cometer os assassinatos, o que, ao meu ver, seria boa prerrogativa para que ele fosse considerado um serial killer psicótico.

 

No mesmo trabalho, mais à frente, existe outra passagem que adiciona mais uma camada na descrição psicológica de Marcelo, que diz o seguinte:

 

“Segundo o psiquiatra que o acompanha, sempre que está lúcido, o que corresponde a maior parte do tempo, ele está tentando manipular pessoas e torturar psicologicamente os internos mentalmente mais frágeis”.

 

Esse relato é importante, pois adiciona mais uma definição para Marcelo, que o próprio trabalho diz, que o define também como um psicopata. Bem, esse assunto, psicopatia, é muito grande e complexo demais para tentar explicar aqui, além disso não tenho cacique para tanto. Mas posso dar um resumo do que tenho ouvido falar sobre tal assunto, pois sou um pouco curioso quanto a isso. O termo “psicopata” há anos está ligado a pessoas muito cruéis, como os próprios serial killers, mas tal transtorno vai muito além disso. Por exemplo, segundo a décima edição do CID, o termo certo é Transtorno de Personalidade Dissocial, F60.2, e pode ser tratado com medicamentos e terapia.

 

O que acontece no caso do Marcelo é que, além da psicopatia, ele foi diagnosticado com mais um emaranhado de distúrbios psicológicos. Aline Cassia Tausher em seu trabalho “A Influência do Laudo Psiquiátrico na Sentença que Declara a Inimputabilidade no Processo Penal” (disponível AQUI), parafraseia Ilana Casoy sobre todas essas características, que são:

 

“Marcelo foi considerado pessoa com traços psicopáticos de personalidade e nas avaliações psiquiatras nas avaliações dos vários incidentes de sanidade mental ao longo de sua internação, não era totalmente capaz de entender o mal que fazia, ele era frio e não tinha capacidade de se controlar. Foi diagnosticado como deficiente mental, doente mental grave que reúne esquizofrenia e psicopatia, portador de distúrbios comportamentais (perversão da conduta) oriundos da convergência de transtornos mentais (oligrofrenia + psicopatia)”

 

(Pausa Dramática)

 

Como já sabemos, sendo considerado culpado no assassinato das 14 crianças, Marcelo não foi preso, mas levado para tratamento em um manicômio judiciário. Isso se deu devido ao Artigo 26 da lei 2.848 (disponível AQUI), encontrando-se dentro do Título III sobre inimputabilidade da mesma, que diz o seguinte:

 

“É isento de pena o agente que, por doença mental, ou desenvolvimento mental incompleto ou retardo, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

 

E é por isso que Marcelo Costa de Andrade, o Vampiro de Niterói, nunca foi sentenciado à prisão.

 

 

Caro ouvinte, não sei se esse episódio conseguiu elucidar alguma coisa sobre as condições mentais de Marcelo e temo que tenho deixado ainda mais questionamentos que afirmações, mas acho que temos informações suficientes inclusas em todos os episódios já publicados que podem nos ajudar a montar um pequeno esquema do funcionamento de sua cabeça.

 

Antes disso, quero só deixar bem claro que o que eu vou dizer não é uma verdade absoluta, mas a conclusão que tomei enquanto juntava os fatos sobre o caso, está bem? Então, vamos lá:

 

Claramente, para mim, Marcelo tem algum distúrbio mental, como a médica psiquiatra Ana Beatriz Barbosa apontou, e sabemos que é desde criança, então é possível que ele tenha nascido com isso. O que ele tinha? Não se sabe. Ele disse que não era bom na escola, o que pode ser Dislexia, TDAH, ou Autismo, e também afirmou que ouvia vozes quando criança, o que pode ser uma característica de esquizofrenia, mas, bem, não é nada possível de se confirmar.

 

Também não é possível confirmar se ele já nasceu com Transtorno de Personalidade Dissocial e Psicose, mas o que posso dizer é que diversos fatores socioambientais contribuem para o surgimento ou afloramento de alguns desses distúrbios. Por exemplo, é comprovado cientificamente que uma pessoa que se utilizada de alguma droga tem grandes chances de desenvolver esquizofrenia.

 

Outro exemplo é uma matéria que li no dia nove de setembro no canal de notícias G1 sobre um caso terrível que aconteceu em 2019 na supervia. O caso em questão é sobre dois jovens que foram abordados por policiais e guardas da estação de trem e sofreram agressão e abusos sexuais dentro da própria estação. A matéria em questão fala do fato de que a mãe de uma das vítimas, hoje com 23 anos e diagnosticado com depressão e traços de esquizofrenia, luta até hoje para que o estado pague a ela uma indenização para pagar as despesas que tem no cuidado da saúde do filho. Você pode ler a matéria completa sobre esse caso AQUI.

 

Esse caso é um bom exemplo de que fatores externos também contribuem para o surgimento de distúrbios psicológicos.

 

No caso de Marcelo, não podemos afirmar que ele tenha ou não nascido com os fatores que o tornaram um assassino serial, mas temo em dizer que, baseado em sua história de vida e crescimento, existam alguns fatores que podem ter contribuído para isso. Marcelo ainda é considerado uma pessoa com o que eles chamam de “doença mental” e os relatos dizem que ele não respondeu positivamente a nenhum tipo de terapias e tratamentos que tentaram, portanto, é possível que ele seja um dos únicos casos no Brasil, se não o único, de pessoa que continuará em um manicômio judiciário por um bom tempo.

 

 

Esse podcast começou com a necessidade de contar melhor o caso do Vampiro de Niterói que me aterrorizava desde quando soube pela primeira vez há alguns anos atrás, mas vejo que ele se tornou algo além: uma tentativa, mesmo que pequena, de mostrar para a sociedade que ainda não lutamos suficiente para que crianças parem de sofrer qualquer tipo de violência.

 

E essa questão está clara pra mim em questões que são discutidas agora, por exemplo. Talvez eu esteja vendo as coisas de um ponto de vista errado, mas eu não consigo entender como há grande movimento de pessoas que se dizem “a favor da vida” e querem penalizar uma mulher que aborta na vigésima segunda semana de gestação, mas não há discussão ou verdadeiras políticas públicas que refletem em como serão a vida dessas crianças, em casos de violência diárias que muitas crianças sofrem, na questão das crianças de rua, na questão de órfãos que muitas vezes não vão ter alguém para chamar de família e terão que sair compulsoriamente de lares adotivos quando atingirem a idade máxima.

 

É muito frustrante pensar nessas variáveis, pois muitas das vezes eu, uma única pessoa em bilhões não pode fazer nada. Mas acredito que fazendo o trabalho que estou fazendo com o podcast já é um passo, mesmo que pequeno, em tentar mudar essa realidade.

 

E por isso, caros ouvintes, devo dizer que o próximo episódio vai ter uma pequena mudança. O próximo episódio será lançado em um espaço de tempo mais longo, no dia 10 de outubro. Vou precisar desse tempo maior, porque preciso conseguir o máximo de informação possível, já que ele será sobre as quatorze vítimas de Marcelo. É necessário produzir um episódio que seja bom o suficiente para honrar com a vida dessas crianças.

 

Bem, por hora fico por aqui e até o próximo episódio. Eu sou Thiago Pined e você ouvia a “Luz e Sombra: O Caso do Vampiro de Niterói.”

 
 
 

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