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Episódio 2: A Primeira Criança

  • Foto do escritor: luzesombra
    luzesombra
  • 18 de jul. de 2024
  • 20 min de leitura

Atualizado: 23 de jul. de 2024


Imagem de uma rua a noite que parece ter chovido, luzes fortes brilhando, moldura que parece folha antiga e os dizeres "A Primeira Criança" destacado em branco com brilho e "Episódio Dois" mais discrito embaixo

Quando vamos pesquisar um pouco sobre a primeira vítima de Marcelo Costa de Andrade, ou o famosos serial killer "Vampiro de Niterói", de 1991, não se encontra uma história exata sobre esse menino. Mas, para entender melhor sobre o que levou Marcelo ao seu primeiro assassinato, precisamos ir mais longe, para a infância do assassino. 


 

AVISO: A história a seguir contém cenas fortes de violência infantil, portanto não é recomendado para pessoas sensíveis ao tema e menores de 18 anos. Todas as informações contidas foram retiradas de fontes públicas. Quaisquer solicitações, favor, enviar um e-mail para luzesombrapodcast@gmail.com




"TARADO ASSASSINO É PRESO EM COPACABANA
O distribuidor de panfletos políticos Marcelo Costa de Andrade, de 24 anos, solteiro, foi preso ontem, por policiais do Setor de Homicídios da 76ª DP (centro) e confessor o assassinato do menor Ivan Medeiros de Abreu, o “Vandi”, de seis anos, na madrugada do último dia 12, na praia do Barreto, em Niterói. O corpo do menino foi deixado dentro da rede de esgoto da praia. O Delegado Roman José Vieira conseguiu a prisão provisória do rapaz, válida por cinco dias. Segundo o inspetor Codong, o irmão da vítima, A. de 10 anos, contribuiu para a prisão de Marcelo.”

 

Essa é uma matéria do Jornal O Fluminense datada de 18 de dezembro de 1991 sobre a prisão de Marcelo Costa de Andrade, o Vampiro de Niterói (disponível AQUI).

 

Agora, algumas reportagens da época contam que o primeiro crime cometido por Marcelo ocorreu em abril de 1991, quando ele voltava do trabalho. Ele, então, encontrou com um garoto que vendia doces na avenida e o abordou, oferecendo dinheiro em troca do menino ajudar ele em um ritual religioso. Só que esse ritual nunca aconteceu e, em uma mata fechada, Marcelo tentou atacar o menino e estuprá-lo, mas o menino resistiu, e, por isso, Marcelo pegou uma pedra e o agrediu, depois o asfixiou e estuprou.

 

Numa outra edição de “O Fluminense” datada do dia 20 de janeiro de 1992 há outra menção (disponível AQUI). A matéria é bem extensa e conta detalhadamente como foi a descoberta das vítimas dele. Tem também a foto de Marcelo, que não aparentava ter mais de trinta anos, cabelos longos, e que aparentava mais uma pessoa comum. A foto está um pouco escura demais por conta do material, mas para mim, não me parece um semblante que desse medo. Nessa reportagem há mais um pequeno resumo sobre a primeira vítima de Marcelo, que diz:

 

“A SEQUÊNCIA DE CRIMES COMEÇOU EM ABRIL DE 91
A primeira vítima do psicopata foi um garoto de 12 anos, ainda não identificado, morto no dia 12 de abril do ano passado, dentro de uma manilha, no final da Avenida do Contorno, início da Estrada Niterói-Manilha. Marcelo de Andrade encontrou o garoto na estação das Barcas, no centro de Niterói e o estrangulou para estupra-lo”.

 

 

Essa é uma das muitas histórias que li durante a minha pesquisa, sempre é uma inconsistência aqui ou ali. Mas para ter a plena certeza do que eu estava contanto, eu precisava dos autos do processo, o que estava sendo bem difícil de conseguir, por que eles foram arquivados. E como a produção dessa história está em seu início, não seria nada fácil pra mim.

 

Eu até tentei contato com a Vara Criminal que cuidou do processo, mas eles informaram que esse processo é físico, ou seja, que não havia nenhuma copia digital do mesmo, mas que se encontra com remessa para o arquivo geral. O processo em questão já havia sido arquivado em 2020, logo depois de ter sido reaberto pelo advogado do réu que solicitava sua soltura.

 

Essa soltura lhe foi negada. Como essa parte do processo é mais recente, consegui ter acesso a sentença desse julgamento, datada de 19 de dezembro de 2019 (disponível AQUI). Ela é uma sentença simples, que fazem parte das folhas 110 e 111 de todo o processo, mas muito que está escrito é só uma explicação bem enfeitada do fato em questão. Por fim, a juíza do caso afirma:

 

“Não concedo ao réu o beneplácito legal de aguardar o julgamento em liberdade, face o que consta de sua FAC, bem como sua deficiência mental que o transforma nume ameaça social.”

 

Vamos para uma breve explicação: a FAC que a juíza diz é a Ficha de Antecedentes Criminais do réu. Em uma breve pesquisa é possível entender que Marcelo foi condenado por estuprar, matar e ainda beber o sangue de 14 crianças, mas que, por conta do laudo de sanidade mental, ele foi sentenciado a ficar internado em manicômios judiciais.

 

Só que não ter essas informações em mãos é um pouco... frustrante.    

 

Mas, de qualquer forma, sigo com a história: houve sim uma primeira vítima que iniciou a série de assassinatos e terminou na prisão do culpado: Marcelo Costa de Andrade, também conhecido como Vampiro de Niterói…. Mas não, esse episódio não é necessariamente sobre essa criança. Para analisarmos ponto a ponto, precisamos voltar para mais longe, e passar pela infância da primeira criança, o elemento que liga tudo. Precisamos entender mais sobre a vida de Marcelo.

 

Eu sou Thiago Pined e você está ouvindo “Luz e Sombra: O Caso do Vampiro de Niterói.” 



 Brasil em 1967


(Os áudios de início de capítulo são creditados ao Rádio Jornal do Brasil, disponível para ouvir por completo AQUI)

 

1967 foi um ano bem difícil para o Brasil, de modo geral. Há dois anos o Brasil tomava um golpe de estado que se tornaria a Ditadura Militar e perduraria por duas décadas. No dia 24 de janeiro desse ano, foi promulgada a Constituição de 1967 sob pressão dos militares que haviam tomado o governo. Essa constituição iria entrar em vigor em 15 de março daquele mesmo ano, institucionalizando a ditadura como o novo governo.

 

No Rio de Janeiro, local de nossa história, houve uma enorme tempestade no estado que ficou conhecida como a tragédia de 1967. Uma tromba d’agua na serra das Araras deixou dezenas de mortos em 24 de janeiro. Foram contabilizadas mais de 300 vítimas apenas em um dia, chegando a aproximadamente 1700 mortos totais em toda tragédia. Em 21 de fevereiro a cidade do Rio também não conseguiu se salvar, outro temporal fez uma encosta no bairro de Laranjeiras deslizar e desabar casas e edifícios, matando cerca de 300 pessoas também. O Rio também era oficialmente conhecido como o “Estado da Guanabara”, que ficou no lugar do antigo Distrito Federal. Tal estado foi fundado no ano de 1960 e foi juntado ao estado do Rio de Janeiro em 1975.

 

Mas 1967 também foi o ano que nasceu a Tropicália, tão forte movimento na música, mas que envolvia todas as artes. O site oficial desse movimento explique que (leia mais AQUI):

 

“O Tropicalismo foi um movimento de ruptura que sacudiu o ambiente da música popular e da cultura brasileira entre 1967 e 1968. Seus participantes formaram um grande coletivo, cujos destaques foram os cantores-compositores Caetano Veloso e Gilberto Gil, além das participações da cantora Gal Costa e do cantor-compositor Tom Zé, da banda Mutantes, e do maestro Rogério Duprat. A cantora Nara Leão e os letristas José Carlos Capinan e Torquato Neto completaram o grupo, que teve também o artista gráfico, compositor e poeta Rogério Duarte como um de seus principais mentores intelectuais.”

 

Outro fato curioso: nesse ano a tão conhecida Favela da Rocinha, na zona Sul do Rio de Janeiro, ainda não era reconhecida como bairro. Entre as décadas de 1950 e 60 ela foi ganhando forças com a chegada de novos moradores oriundos do nordeste do país, que chegavam à procura de uma vida melhor e emprego. No início da década de 1960, o então governador do estado da Guanabara, Carlos Lacerda, implantou uma política de remoção das favelas. Ele queria transferir essas pessoas para regiões mais afastadas do Centro da cidade e zona Sul. No entanto, essa política perdeu suas forças e com sua saída no ano de 1965, essa ideia foi esquecida. E a Rocinha foi crescendo, recebendo ainda mais moradores que vinham para trabalhar nas obras dos túneis Rebouças e Dois Irmãos, esse chamado agora de Zuzu Angel, inaugurados em 1967 e 71, respectivamente. E é nesse local em ascensão que nasce Marcelo Costa de Andrade, no dia 2 de janeiro desse ano de 1967.

 

Infância de Marcelo

 

Filho de dona Sônia Xavier de Costa, uma empregada doméstica, e o pai era dono de um bar. Pesquisei em muitos bancos de dados e muitas entrevistas, mas nunca consegui encontrar o nome do pai de Marcelo, como eu não tinha acesso aos autos do processo, tive que me contentar com a falta de algumas informações que para mim seriam bastante importantes.

 

Mas uma coisa que estava bastante explícita em todas as matérias sobre a história de vida dele era que ele presenciava frequentemente sua mão sendo vítima de violência dentro de sua própria casa. E isso aconteceu até seus cinco anos de idade, quando seus pais se separaram e o pai o levou parar ir morar na casa dos avó no Ceará.

 

Nessa parte eu queria fazer apenas um parêntese sobre essa terrível cena da infância dele e relacionar com nossa sociedade. Talvez isso possa ser um ângulo fora do sentido desse podcast, mas acho importante dar minha singela opinião aqui, pois o objetivo desse trabalho também é social, de mostrar diversos fatores que agregam significado à sociedade em que vivemos.

 

E é um tanto curioso e, ao mesmo tempo, triste de perceber o quanto o patriarcado ainda é muito presente. Nem discutiremos isso em 1967, pois sabemos que os tempos eram ainda bem piores para a mulher, mas, enquanto analisava os fatos para a produção desse episódio, ficava me fazendo algumas perguntas que quero relatar aqui como um jeito para refletir:

 

Por que o nome do pai de Marcelo não é mencionado, já que foi ele quem o levou para o Ceará?

Por que não temos mais informações sobre isso?

Por que a mãe é quem tem que dar as caras?

Por que é ela que tem que ter todo o peso da sociedade?

Por que as matérias polparam o pai do assassino?

O que deve ter acontecido com o pai quando Marcelo foi condenado serial killer na década de 1990?

 

Depois de algum tempo de pesquisa, consigo saber o nome do pai de Marcelo: Manoel Gomes de Andrade. E ele só é mencionado em uma matéria do Folha de São Paulo, de 6 fevereiro de 1997, quanto o assassino foi recapturado.

 


 

Bem, nas minhas pesquisas pela história de Marcelo, me deparei com algumas inconsistências que me deixavam com ainda maiores questionamentos. Por exemplo, pouco antes eu disse que o pai o havia levado para o Ceará, mas uma outra matéria que li dizia que a mãe que o levou, pois ela queria afastá-lo desse ambiente abusivo. Também disse que os pais se separaram quando ele tinha 5 anos, assim que foi morar com os avós, mas outros lugares dizem que eles se separaram quando Marcelo já estava morando no Ceará.

 

Eu não tinha os autos do processo. Mas minha incansável busca por entender a vida dele chegou a alguma coisa tão interessante quanto. Klaylian Marcela Santos Lima Monteiro é uma psicóloga pesquisadora de São Paulo e seu trabalho de doutorado foi um achado para que eu conseguisse montar esse episódio, além de ser também muito importante para o tema no Brasil e se tornar um livro.

 

 O trabalho “Assassinos Seriais: Uma abordagem psicanalítica sobre o superego arcaico e os efeitos da sideração” (disponível AQUI) de 2012 tem uma peça que me ajudou muito em esclarecer alguns pontos que me deixaram um por alguns nós que haviam ficado soltos: ela havia conseguido em primeira mão uma entrevista com Marcelo. Além disso, o trabalho dela tem também uma entrevista com Francisco da Costa Rocha, ou Chico Picadinho, também assassino serial muito conhecido na década de 1970.

 

Vamos então aos fatos retirados diretamente por Marcelo: na transcrição da entrevista presente no trabalho de Monteiro, Marcelo diz que seu pai o havia levado para morar com a avó, depois dele se separar da mãe. Ele também disse que foi morar em um local se chamado “Sangradouro” e que havia um açude perto. Então fui pesquisar mais informações sobre essa cidade para ficar o mais claro possível aqui no episódio.

 

Mas antes eu tinha algumas informações além das que consegui ne trabalho de doutorado: Em uma matéria que li havia sim a menção a um local chamado Sangradouro pertencente à cidade de Sobral, no Ceará. Outra matéria que mencionei no primeiro episódio do podcast informa que Marcelo, no ano de 2017, foi encontrado na cidade de Guaraciaba do Norte, onde seus avós moravam, depois de fugir do manicômio.

 

Então fui ligar os pontos: fui pesquisando pelo mapa mesmo qualquer lugar perto de Sobral que pudesse ter o nome de “Sangradouro”, mas não encontrei vestígio. Depois procurei por Guaraciaba do Norte e lá estava ela: um município que atualmente tem pouco mais de 43 mil habitantes no oeste do estado do Ceará, já na divisa com o estado do Piauí. Ela também é uma cidade com maiores altitudes do estado e fica a aproximadamente uma hora e quarenta e dois minutos de Sobral.

 

Eu cheguei a achar uma espécie de vilarejo chamado “Sangradouro”, mas ele ainda me gera dúvidas, pois fica muito ao sul do estado, e mais de quatro horas de Sobral. E tirava qualquer ligação que achei nas já nas outras cidades.

 

Por muita sorte, a mãe da minha melhor amiga veio também de uma cidade perto de Sobral e pude fazer algumas perguntas sobre isso que achei pra ver se elucidava alguma coisa. Foram elas:

 

1. O que é esse Sangradouro perto de Sobral no Ceará?

2. ⁠Guaraciaba do Norte fica perto? Ou muito longe?

3. ⁠seria fácil conectar esses lugares? Quero dizer? Elas poderiam ser vistas como uma coisa só pra quem não conhece?

 

O que ela me respondeu foi que sangradouro que ela conhecia era quando o açude enchia muito e transbordava, que açude é como se fosse um rio grande, que Guaraciaba do Norte não fica nem perto nem longe, e que são cidades distintas, não é possível Sobral de Guaraciaba, por exemplo. Perguntei também se, por acaso, eles conheciam essa história pela cidade dela, mas ela disse que não.

 

Eu queria adicionar também que o Ceará é um estado com muitos açudes, o que você percebe que não é assim muito fácil de procurar por um local em específico. Também que ria informar a definição de açude feita pelo governo (disponível AQUI), que exprime que:

 

“açude é uma barragem, barreira artificial, usada para reter água, podendo reservar água da chuva ou da água corrente de algum rio existente, muito usado em regiões onde há escassez de água durante períodos de estiagem e também para outras finalidades.”

 

Depois de toda essa informação, eu consegui duas teorias sobre onde os avós de Marcelo moravam:


Uma, de que, pelos relatos que vi, eles moravam bem perto de um açude, possivelmente entre as cidades de Guaraciaba do Norte e Sobral, pois li muitas vezes que ele costumava brincar nas águas do açude. Duas: ele realmente foi morar nessa localidade de Sangradouro, há quatro horas de Sobral. Quando li a entrevista de Monteiro, foi fácil perceber que ele não parece realmente condizente com sua mente. As informações saem desconexas, parecendo não ter relação entre si.

 

Sobre a relação de Marcelo com os avós, a entrevista não tem muitas informações: tudo que sei pelo documento é que ele vivia bem com os avós e que ela o tratava bem. Só quem em outros lugares que pesquisei, algumas informações eram diferentes. Por exemplo, o site UOL fez uma matéria especial com alguns episódios sobre o caso, e, em um artigo do dia cinco de julho de 2022 (disponível AQUI), eles dizem que:

 

“Tentando afastar o filho desse ambiente, abusivo, ela chegou a manda-lo para morar com os avós durante um período no Ceará. O problema é que os dois o batiam muito.”

 

Outra coisa que não consegui muita informação é se esses avós eram por parte de pai ou mãe.

 

Bem, como eu tinha bem pouca informação e, mesmo com a entrevista feita por Marcela Monteiro ser de grande valia para a criação desse episódio, ela foi feita apenas em 2012, praticamente dez anos depois de Marcelo ser preso, algumas informações que ele passou poderia estar um pouco diferente das que ele passou em 1991. Eu queria mesmo era ter acesso aos autos do processo, mas estava completamente impossível.

 

Mesmo com essa frustração, continuei a minha pesquisa e, de modo geral, entendi que: Marcelo ficou um período de cinco anos com os avós no Ceará. Era bem provável que esses avós o batessem com frequência, sabe-se que esse era um método muito usado por pessoas mais velhas, achando que assim ensinariam de alguma forma. E, colocando a hipótese assim bem geral de que Marcelo apresentava alguma deficiência mental já naquela época, isso tudo só piorava ainda mais as coisas.

 

E nesse ponto da história em que Marcelo ainda tem aproximadamente dez anos de idade, talvez uma deficiência mental não diagnosticada, não tinha os pais ao seu lado, havia passado por violência contra a mãe quando mais novo... Chega a ser doloroso de pensar que aquele pobre menino já estava bastante deteriorado por dentro.

 

O problema é que, ao voltar para o Rio, sua vida pioraria ainda mais.

 

 Adolescência

 

Entre nove e dez anos de idade, então, a mãe de Marcelo o buscou da casa dos avós no Ceará e o trouxe para morar no Rio novamente. Na entrevista que ele concedeu à Monteiro, ele disse que foi morar na cidade de São Gonçalo, com a mãe e o seu novo companheiro. Na verdade, algumas fontes afirmam que nessa época ele ficava alternando entre as residências do pai e da mãe.

 

Já para Monteiro, Marcelo disse que ele ficou alguns meses com a mãe até que seu pai o pegou para morar com ele, e foi aí que fugiu para a rua. Ele só não sabia dizer muito mais sobre isso, se era bom ou ruim, o porquê de ele fugir, esses detalhes.

 

Como eu tinha apenas a internet como minha aliada nessa pesquisa, então eu tinha que pegar o máximo de referencias que eu podia para detalhar essa linha do tempo da vida dele e entender um pouco do passo-a-passo que o fez se tornar esse assassino serial. Por isso, vou citar uma fonte que, para muitos pesquisadores, não é confiável; o Wikipédia (disponível AQUI). Mas na página de Marcelo havia uma informação que, para mim seria muito importante de passar para você, ouvinte. Existe nela a menção de que, nesse período que ele passava entre a casa do pai e da mãe, Marcelo foi abusado sexualmente por um homem mais velho.

 

Vi essa informação em outras fontes de pesquisa, que diziam também que ele sofria nas mãos de seu padrasto e madrasta. Já na entrevista, tudo que ele conta é que aos dez anos de idade ele fugiu e casa e ficou nas ruas até os 18. Conta também que foi com essa idade bem jovem que ele começou a trabalhar com prostituição. Ganhava dinheiro se prostituindo até os 18 anos de idade, na Cinelândia, região do Centro do Rio de Janeiro.

 

Enquanto pesquisava sobre o tema, me vieram algumas informações bem preciosas para essa parte da história. Em um texto de Miguel Angelo Ribeiro de título “Prostituição de Rua e Turismo: A procura do prazer na cidade do Rio de Janeiro” (disponível AQUI) publicado na Revista do Departamento de Geografia da UERJ no ano de 1998, existe um trecho especialmente para a Cinelândia, que diz o seguinte:

 

“A antiga "Broadway" carioca concentra numerosas opções de lazer tais como cinemas, bares e restaurantes, o Teatro Municipal, Museu de Belas Artes, Biblioteca Nacional, Sala Funarte e em seu conjunto muitas agências bancárias oficiais e privadas, além de vários prédios e lojas comerciais, pontos finais de ônibus municipais e a estação do metrô, além de alguns hotéis tradicionais que recebem turistas devido a sua localização privilegiada.
As muitas opções de lazer e serviços e o grande movimento diário de pessoas contribuíram para o surgimento desse território, com a presença da prostituição masculina durante o dia e a noite. Os "michês", em sua maioria, circulam pela praça a procura de clientes potenciais, dentre os quais encontram-se os levados por amigos, que ocupam os bares e restaurantes existentes na "Cinelândia"

 

Também achei uma matéria do jornal Extra atualizada no dia 14 de dezembro de 2010 que apresentam dados alarmantes da Secretaria Municipal de Assistência Social principalmente para o ano, que são direcionados ao fato de que a região do Centro da cidade do Rio de Janeiro era a área com mais prostituição infantil. Os dados onze bairros da cidade que havia casas de exploração infantil, eram 196 crianças nessa situação. No ano anterior eram 122 casos. E em 2007, eram 250 casos no total.

 

Isso me deixa ainda mais alarmado, pois esses dados têm apenas 14 anos. Além disso, esse ano, houve o registro de 11 mil denúncias de violação de sexual contra crianças e adolescentes. Marcelo tinha 10 anos, quando começou a se prostituir em 1977, 33 anos antes da matéria do jornal Extra ­– e nada parece ter mudado. Enquanto isso, nossos governantes estão mais preocupados em transformar uma pessoa que abortou por estupro ou qualquer outra situação em assassino, talvez até pior que Marcelo Costa de Andrade.

 


 

Na entrevista concedida, Marcelo disse que se prostituiu dos 10 aos 18 anos de idade e ficou morando na rua por todo esse tempo. Ele informou que no começou não gostava muito, e que fazia para conseguir ganhar dinheiro para sobreviver. Com o que ganhava, então, ele começou a fazer viagens para outros estados, além de pagar para ficar em hotéis que ele também usava para atender a clientes.

 

Em algum período entre os 10 e 14 anos de idade, que não fica muito claro nas entrevistas e artigos que li, Marcelo é mandado para uma certa “casa dos meninos”, em outros lugares vi a informação de que essa casa, na verdade, seria uma espécie de internato para meninos, onde ele ficou até os 14, pois essa instituição não acolhia jovens com idades maiores que essa. Algumas fontes ainda dizem que dentro dessa instituição ele sofria com bullying e era chamado pejorativamente de “retardado”.

 

Depois dessa casa, ele voltou a se prostituir e ficar na rua, foi quando ele foi levado para a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, a FUNABEM, que foi criada pelo governo em 1964. Bem, ele é um órgão a nível federal, que visava avaliar e estar diretamente relacionado à FEBEM, essa a nível estadual. Essas fundações visavam acolher menores infratores e ajustá-los novamente à sociedade.

 

De maneira geral, a FUNABEM fechou em 1990, mas a FEBEM continuou por mais um tempo. Existe diversos fatores que eu poderia explicar sobre o sucateamento desse órgão, mas como Marcelo não ficou por muito tempo, me resumo em dizer que, em 1999 houve um motim na instituição em São Paulo, que fez o então governador Mário Covas fechar esses lugares para uma possível reorganização.

 

Havia uma espécie de linha mais ou menos organizada na parte da história de juventude de Marcelo, depois de tudo que apurei, marquei alguns pontos:

 

  • Aos 10 anos de idade ele foge de casa e vai morar na rua.

  • É nessa idade que ele começa com a prostituição.

  • Entre 10 e 14 anos, ele é colocado em um internato para meninos.

  • Com 14 ele teve que sair dessa casa e voltou para as ruas. Foi então que ele sofreu algo que o perturbou bastante que o fez querer se matar.

  • Por esse ocorrido, ele foi mandado para a FENABEM, mas durou alguns meses até fugir de lá.

  • Voltou a viver nas ruas, mas logo depois encontrou alguém que mudaria novamente sua vida.

 

Essa parte da vida dele é ainda mais solta. Muitas vezes, me vejo lendo esses artigos e matérias e me dá a impressão de que queriam apontar alguns motivos para transformar ele em um monstro do que contar a verdadeira história. Então eu tive que ir mais a fundo, ir atrás de quem ficou frente a frente com Marcelo. E me veio um nome que muitas das pessoas que são interessadas por crimes reais e serial killers já deve conhecer: Ilana Casoy.

 

Ela é uma escritora e criminóloga e tem grande bagagem sobre o assunto, sendo especialista em assassinos em série no Brasil. Muitas das vezes que a polícia se deparou com casos diferentes do dito comum, eles pediram seu apoio. Como seria impossível conseguir uma entrevista com ela para esse podcast, fui atrás de outras fontes e descobri que em seu livro “Arquivos Serial Killers: Made in Brasil”, além de contar a história do Vampiro de Niterói, existe entrevistas dela própria com Marcelo.

 

Como qualquer informação valia, eu decidi comprar e ler o livro. E ele me elucidou em diversos momentos desse quebra-cabeças.

 


 Juventude e Relacionamento

 

O capítulo de Marcelo é muito bem dividido e diversos fatos e fatores. Primeiro, Ilana conta com suas próprias palavras a história dele e seus casos, apresentando fatos importantes e não falados anteriormente ou encontrados na internet. Existe também o diferencia em seus textos de que a própria Ilana foi visitar Marcelo e fazer essa entrevista, saber sobre sua história diretamente dele é muito importante para que se verifique muitas informações. Aí sim mais certa de sua vida antes dos crimes, com essas novas informações, consegui fazer uma linha do tempo mais contextual. Que mostra o seguinte:

 

  • Marcelo Costa de Andrade nasceu na favela da Rocinha no dia 2 de janeiro de 1967, sua mãe trabalhava em casas de família e seu pai tinha um bar.

  • Até os cinco anos, ele via seu pai bater frequentemente na sua mãe quando estava alcoolizado.

  • Aos cinco, depois dos pais se separarem, foi levado da avó no Ceará em comum acordo pelos pais (Pelo que entendi, esses avós eram pais por parte do pai dele). Ele chorou muito por ter que ir.

  • Desde criança já tinha alguns sintomas estranhos, sangrava pelo nariz e via fantasmas.

  • Viveu até os 10 anos de idade. Ele disse que a cidade era Sangradouro, em Sobral, mas continuo desconfiando que era um pequeno vilarejo pelas margens de Sobral no Ceará perto de um açude. Disse também que sua avó era severa e batia nele com cinta quando ele fazia algo de errado, tinha muita dificuldade na escola, não aprendia rápido como as crianças.

  • Aos dez ele é trazido de volta para o Rio pela mãe e vai morar com ela e seu padrasto em São Gonçalo. Ele dizia que o novo marido da mãe era pai de santo e não gostava muito daquilo. Mas eles não eram ruins para ele.

  • Havia também uitas brigas entre a mãe e o padrasto, saía e voltava de casa muitas vezes com a mãe. Até que ela decidiu arranjar um emprego de doméstica e não voltar pra casa.

  • Ficou 3 meses morando com a mãe até se mudar para a casa do pai e nova esposa. Ele informou que todos eram legais, mas que a madrasta não gostava muito dele na casa e não tratava ele muito bem.

  • Os pais já tinham novos filhos com esses novos cônjuges. Eram dois filhos por parte de pai e dois por parte de mãe. Ele também teve um irmão mais velho filho dos dois pais, mas que havia morrido.

  • Foi aí que ele decidiu morar na rua, ficou morando na rua por um tempo perto da Central do Brasil no centro do Rio de Janeiro. Existe uma menção de que alguém o violentou sexualmente e foi por isso que ele começou a fazer programas.

  • Ele também é colocado em um internato pelos pais. Na pesquisa de Ilana, a linha do tempo fica com ele indo para o internato assim que sai da casa do pai, mas foge logo em seguida e vai viver nas ruas. Em outros lugares é dito que ele fica na, depois alguém da família o coloca nesse internato e ele tem que sair aos 13 ou 14 anos de idade.

  • Há também menções de que ele ficou um tempo morando com a mãe, mas logo volta para a rua, onde ganhava dinheiro com prostituição. Viajava para vários lugares do Brasil, e tentava sempre voltar para onde a avó morava no Ceará, mas não acha a localização exata. Ele diz que, quando o dinheiro acabava, ia para instituições como a FEBEM que o traziam de volta para o Rio.

  • Ficou por bastante tempo morando na rua, entrando em instituições e fugindo. A Ilana também apontou que, na verdade, ele ficou por um tempo na Central do Brasil e depois se mudou definitivamente para a Cinelândia, pois o nome o remetia à Disneylãndia. Marcelo também gostava muito de desenhos, como pica-pau, Mickey, tio Patinhas, e via muito os Trapalhões e Xuxa.

  •  Quando tinha 16 anos, ele começou um relacionamento com um homem mais velho.

  •  Ilana também adiciona a informação de que ele havia tentado abusar do seu irmão quando tinha 17 anos, esse irmão estava nos seus 10 anos de idade.

  •  Com isso, ele tenta voltar para a casa da avó, mas sem sucesso, pois é preso pelo juizado de menores, que o leva de volta para o Rio de Janeiro. Mesmo assim, tenta novamente e, dessa vez encontra uma tia que o trata muito mal. Por isso, Marcelo rouba ela e volta para o Rio.

  • Mas seu pai não o aceita, então Marcelo volta a morar na rua e trabalhar com prostituição.

  • Então, ele conhece um homem mais velho. Em outras fontes que li, descobri que era um porteiro de um prédio de nome Antônio. Nessa época também ele começou a frequentar cultos da igreja Universal do Reino de Deus, depois de ouvir um culto na TV. Morou com esse homem por 4 anos até o homem decidir se mudar para Salvador sem ele.

  • Com 23 anos, então, Marcelo volta a morar com a mãe. Consegue um emprego em distribuição de panfletos de ouro e prata. E é no ano seguinte, em 1991, que Marcelo começa sua vida de crime.

 


 

Dá pra perceber que a história de Marcelo é meio complexa e estranha. Mesmo que dê para seguir tipo um script de fatos importantes desde seu nascimento até sua vida de crimes, algumas informações não são muito conexas, sendo interpretadas de diferentes formas por vários veículos de imprensa. Para mim, a história que Ilana Casoy relata é a mais verossímil, afinal, ela é uma especialista no assunto. Além disso, lendo as entrevistas feitas com ele tanto da Ilana quanto da Marcela Monteiro, dá pra entender um pouco o porquê dessas informações que não se encaixam: o processamento de relatos de Marcelo não é contuso e organizado. Ele vai e vem nas histórias é muitas vezes é difícil de conectar, pois uma hora ele fala uma coisa, na outra ela muda aqui ou ali. O que me mais me choca lendo esses relatos é que, quando ele vai falar sobre as mortes das crianças, ele consegue explicar com detalhes todo o passo-a-passo. Me dá a entender que essa parte de sua vida foi fixada em sua mente com uma importância acima de qualquer outra história.

 

Mas vamos lá, em 1991 Marcelo tinha 24 anos de idade quando foi preso. A primeira entrevista de Ilana com ele foi em setembro de 2003, quando ele já tinha 37 anos de idade. Já havia passado 12 anos de quando ele foi preso e deu seu primeiro depoimento para a polícia. Mesmo com todas as informações que consegui durante todo esse processo de pesquisa, havia algo dentro de mim que ainda pedia mais. E como esse meu podcast é cheio de coincidências, havia ainda mais uma.

 


 

Bem, vou dar um spoiler aqui sobre os próximos passos desse podcast:  achei um jeito de conseguir, finalmente, os autos do processo, que me ajudariam a esclarecer algumas perguntas que eu estive me fazendo. Mas essa história vai continuar apenas no próximo episódio! Até lá!

 
 
 

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